quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Muros

Esta é a estória,
deve-se contá-la olhando por sobre muros.
Havia um garotinho
empoleirado sobre os telhados da sua casa
e das casas vizinhas,
e seus muros.
E era como um gato com medo de altura.
E foi fazendo de telhados e muros
mirantes,
olhantes,
telas de cinema.
Até onde podia ver? até o fim do mundo.
Nada mirabolante,
não tinha como ser visto por ninguém,
exceto por alguém que olhasse desde o céu.
Teve uma tarde o menino decidiu
que a cidade estava mal arranjada,
em toda volta uma grande bagunça,
que pouco ou nada prestava a alguma coisa.
Por isso,
(ouça a estória olhando por sobre muros)
trouxe, em primeiro lugar, o mar
pra bem perto de casa,
ali na esquina seria praia agora.
E derrubou uns dois prédios novos
pra ver as colinas distantes, no leste
e podia ter movido tantas coisas mais,
um rio que enchia
uma torre de energia que brilhava
um caminhão Scania
e um vulcão,
mas voltou-se pro quintal.
Ali desenterraria raridades!
Ossos de dinossauro, inclusive,
e quinquilharias
do arco da velha,
que venderia ao ferro velho,
pra comprar sorvete.
A terra do quintal seria mágica,
com poder de reverter sepulturas e...
só de se pensar nisso...!
Ah, mas a gente morta não gostou da intromissão,
e por isso vieram fantasmas
ao quintal
e entraram pela cozinha
pra espiar na porta do quarto.
Como não iam embora,
o menino se encolheu num canto
e decidiu um inverno com neve,
(pois este frio só se sente
estando por sobre muros)
e que sua casa seria uns 100 metros menor
pra não caberem tantos,
tantos fantasmas.
Melhor mesmo foi descer dos muros
e andar de bicicleta,
até o próximo quarteirão e de volta,
quatro vezes o mesmo caminho,
que é a distância do fim do mundo
pra quem olha do nível da rua.

(19/01/2010)

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